Em outubro, o Dia das Crianças é comemorado no país, um momento em que muitos lugares se enchem de brinquedos coloridos e mensagens de alegria. No entanto, ao examinarmos com atenção as realidades das diferentes infâncias brasileiras, notamos que nem todas as crianças são celebradas e protegidas de forma igual. As crianças negras, por exemplo, enfrentam o racismo, desigualdades históricas e episódios de violência que dificultam seu direito de sonhar e impõem uma constante luta pela sobrevivência.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), criado em 1990, garante direitos fundamentais para crianças e adolescentes, como o direito à vida, à saúde, à educação e ao respeito. Teoricamente, o ECA assegura que todas as crianças devem ser protegidas e ter a possibilidade de sonhar. No entanto, na prática, as crianças negras encontram dificuldades em acessar esses direitos garantidos por lei. O racismo ainda permeia a vida delas, comprometendo sua segurança, desenvolvimento e bem-estar.
Desde cedo, crianças negras são alvo de estereótipos e têm seus corpos racializados, algo que a psicóloga Cida Bento explica como um “Pacto da Branquitude”. Nesse contexto, pessoas brancas se unem para preservar privilégios, enquanto os corpos negros são tratados como “desvios”. Essa dinâmica social expõe as crianças negras a situações adversas, forçando uma maturidade emocional que nem mesmo os adultos deveriam enfrentar.
O racismo afeta diversos aspectos da infância. A falta de representação nos brinquedos, na mídia e na literatura, assim como brincadeiras racistas, contribuem para um ambiente hostil. As agressões e a ausência de apoio e escuta prejudicam a autoestima das crianças negras, levando a uma infância marcada pelo medo e pela dor. Enquanto algumas crianças são valorizadas em sua totalidade, outras vivem a sombra da marginalização.
A professora Lucimar Rosa Dias destaca que essa falta de proteção compromete o desenvolvimento saudável das crianças, gerando impactos físicos e psicológicos. A infância é uma fase crucial para moldar o ser humano, e a experiência com o racismo prejudica a percepção que as crianças negras têm de si mesmas e do mundo ao seu redor. Elas são forçadas a entender o racismo antes de conseguir nomeá-lo, o que é uma carga pesada para qualquer criança.
Neste Dia das Crianças, é importante que a celebração vá além de presentes e festas. Cada sorriso deve ser acompanhado de proteção, cada brincadeira deve ser situada no respeito e cada sonho precisa ser nutrido com amor. A cada momento de alegria de uma criança negra, vencemos um pouco da desumanização histórica que a população negra enfrentou. Que outubro sirva como um lembrete do direito de todas as crianças a viverem suas infâncias plenas e livres de qualquer forma de violência.